Vagueando toda a noite.
Bebendo todo o dia.
Vida de pobre
Ninguém nos tira uma fotografia.
Já aborrecidos à tarde
Bafámos um charro.
A alegria voltou
Mijámos em cima de um carro.
Embora o verso pareça fácil
Ainda tive de reflectir um bocado.
Agrada-me escrever
Sobre o futuro, presente e passado.
João Gomes, #32, in Poemas na Madrugada
Trabalhar com livros dá-nos o privilégio de descobrir as melhores pérolas obscuras (leia-se negras) da literatura.
É o caso de João Gomes e os seus Poemas na Madrugada, colecção de 34 desabafos que será, talvez, o melhor achado no universo da poesia nacional.
Poeta audaz, que se eleva acima de conceitos como métrica ou conteúdo, o sujeito da obra de Gomes é um ser angustiado que dá muitos passeios. Mantendo uma inocência literária que muitos de nós perdem por volta da pré-adolescência, os poemas dividem-se entre a sua visão do mundo (que nunca percebemos muito bem qual é), a mágoa de um amor falhado (Todos os sorrisos que vejo / Possuem a falta do teu), alguma luxúria (Anda cá / Onde vais tu? / Fêmea / Com alma de fogo) e o Jim Morrisson.
No mínimo original, a poesia de João Gomes pertence à mesma categoria que as melhores telenovelas de todos os tempos ou o fenómeno Ken Lee: expressões artísticas que se assumem perante o mundo com uma coragem invejável e que, de tão más, não as conseguimos largar.
3 zumbidos:
16/04/2009, 23:34:00
nem dick hard consegue competir com a magnitude poética de João Gomes. creio que ele está para a poesia como um dia estiveram os milli vanilli para a música.
16/04/2009, 23:36:00
provavelmente o melhor éro que já gastei na vida :D
17/04/2009, 01:49:00
Ai que lindo poema, digno de um F.J. Martins, passo a citar:
Adeus chulé
Muitos mosquitos no Cumoré
E a catinga a cheirar tão mal
Nossa comissão está no final
No regresso já temos a fé
Vamos vivos estamos de pé
De irmos breve é um sinal
E paramos na Ilha do Sal
Viajar de avião que rápido é
Olhando vemos em baixo a maré
Na metrópole também temos café
Irá de um País assim tropical
É importante lá não temos banzé
Por isso dizemos adeus Guiné
Já nos vamos para Portugal
in Sonetos Verdadeiros
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